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18ª Exposição do Fila Brasileiro CAFIB na Espanha
Elche 2023
O oficialmente chamado Reino de Espanha é, no mundo todo, depois do Brasil, o país que mais promoveu Análises de Fenótipo e Temperamento, além de Exposições de Fila Brasileiro do CAFIB. Esta, em 28 de outubro de 2023, em Elche, foi a 18ª realizada em terras espanholas.
Como de praxe, registramos algumas curiosidades sobre o local do evento. Além de seu território continental, a Espanha ainda inclui os arquipélagos das Ilhas Canárias, na Costa da África, e as Ilhas Baleares, no Mar Mediterrâneo, além de ilhotas no Mar de Alborão (a parte mais ocidental do Mediterrâneo). Com isso, é o maior país da Europa Meridional, o segundo maior da Europa Ocidental e da União Europeia, e o quarto maior de todo o continente europeu. Aliás, das ilhas Canárias originou-se um cão molossóide que tem muitas similaridades com o Fila Brasileiro: o Presa Canario, ou Dogo Canário. Esses cães, que costumam ser amarelos ou tigrados, geralmente com máscara preta, são utilizados como guardas de propriedades, principalmente rurais, e no manejo de gado bovino. A raça foi reconhecida oficialmente pela FCI (Fédération Cynologique Internationale) em 2011.
Há alguns anos tive a oportunidade de julgar uma Exposição do CAFIB em Málaga, cidade andaluza na costa do Mediterrâneo, originada de uma colônia grega na antiguidade clássica. Historicamente, cerca de 200 anos Antes de Cristo, a maior porção da Península Ibérica começou a formar parte do Império Romano. No século V, povos germânicos, vândalos, alanos, visigodos e bizantinos passaram a dominar a região. Na porção sul, destaca-se a comunidade autônoma de Andaluzia, que engloba mais de 700 municípios e cuja capital é Sevilha, onde se situa a maior catedral gótica do mundo. Sobre o nome desse local, alguns dizem que provém de Al-Andalus, denominação usada séculos atrás pelos muçulmanos para se referir à Península Ibérica. Outros afirmam que se origina de Vandaluzia, palavra derivada de Vândalos, os integrantes de uma tribo de bárbaros germânicos que, antigamente, ocuparam a região. A Andaluzia é o berço do flamenco, das “tapas” e das touradas.
O flamenco (música, canto e dança) foi declarado Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade pela UNESCO (United Nations Educational, Scientific, and Cultural Organization). Aliás, a Espanha é o terceiro país do mundo com o maior número de locais reconhecidos pela UNESCO como Patrimônio da Humanidade (atrás apenas da Itália e da China). E, como curiosidade, também ocupa o terceiro lugar na União Europeia em consumo de maconha e cocaína.
As “tapas” (ou “pintxos”, no País Basco) são petiscos ou tira-gostos que acompanham o vinho ou a cerveja. A versão mais aceita sobre a origem do nome é atribuída ao antigo costume, nas tabernas e estalagens, de colocar fatias de pão ou de presunto “tapando” a boca dos copos ou canecos de vinho e de cerveja para impedir que poeira e insetos caíssem na bebida. Elas evoluíram com o tempo e hoje, as centenas de tipos de tapas muitas vezes chegam a substituir as refeições e até a tradicional ceia de Ano-Novo. Aliás, vale registrar que, em toda a União Europeia, a Espanha é recordista em número de bares por habitante, com mais de 700 mil estabelecimentos, que respondem por 15% da economia do país.
A prática das touradas data da antiguidade clássica e foi retratada em afrescos nos palácios gregos, sendo muito conhecidos os da Ilha de Creta, onde, segundo as lendas mitológicas, viveu o célebre Minotauro, do labirinto. Tecnicamente chamado de tauromaquia, o combate de homens com touros tornou-se muito popular, principalmente na Espanha. No Brasil, as touradas chegaram a ser realizadas em diversos estados e havia praças de touros em Curitiba (PR), São Paulo (SP), Santos (SP), Cuiabá (MT), Salvador (BA) e Rio de Janeiro (RJ), então capital do País onde, em 1922, elas chegaram a ser filmadas como parte das comemorações pelo Centenário da Independência. Foram proibidas em todo o território nacional, por Getúlio Vargas (1882 – 1954), em 1934. Voltando à Espanha, as touradas, polêmica e controvertida tradição, nestes tempos politicamente corretos é execrada pelos defensores dos direitos dos animais, que não admitem causar sofrimento e morte a um ser vivo para fins de entretenimento; e, por outro lado é defendida pelos que argumentam ser uma atividade tradicional e cultural que gera empregos, além de preservar a existência dos bovinos que, por não constituírem uma raça, são lá conhecidos como “Toros Brabos”, ou “Toros de Lidia” (e nos países de língua inglesa: “Spanish Fighting Bull”). Aqui no Brasil, eles costumam ser equivocadamente chamados de “Miuras”, supostamente o nome de sua raça. Na verdade, são escolhidos para as touradas os exemplares machos de uma população bovina não muito homogênea e selecionada pela índole agressiva, pelo potente aparelho locomotor e pelos chifres grandes apontados para a frente. Vêm sendo criados desde os tempos do Império Romano para espetáculos sangrentos nas arenas e, até hoje, quando ainda jovens, são rigorosamente selecionados por meio de testes que avaliam sua coragem e resistência à dor. Já Miura é o nome de um antigo criatório (lá chamado de “ganaderia”) na província de Sevilha, na Andaluzia, famoso pela ferocidade dos seus touros e conduzido pela família Miura desde meados do século XIX. Sobre esses animais, que foram se tornando lendários, passaram a correr histórias folclóricas. Dizia-se que passavam algumas horas por dia confinados num curral em cujo centro era colocado um boneco, ou um espantalho, que eles eram estimulados a atacar; que eram alimentados apenas com grão de bico preto e precisavam percorrer uma légua de caminho para beber água; que eram intensamente provocados por funcionários que lhes batiam na cara com seus sombreiros; que tinham uma costela a menos que os outros bovinos. E conta-se que alguns valorosos toureiros já chegaram a se recusar a entrar na arena ao saber que o animal que lhe caberia enfrentar era um Miura.
Ainda no âmbito da tauromaquia, vale ressaltar que, na Inglaterra, as multidões eram atraídas por um esporte sangrento chamado “bull baiting”, constituído por lutas de touros com cães e que deu origem à raça canina Bulldog. E também é interessante registrar que o antigo cavalo ibérico, internacionalmente conhecido como Andaluz, é, na Espanha, chamado de Pura Raza Española e, em Portugal, de Puro Sangue Lusitano. A grande diferença na seleção funcional desses equinos nos dois países é que, enquanto os espanhóis toureiam a pé, os portugueses o fazem a cavalo; e, em Portugal, antes de entrar na arena, os touros têm a ponta dos chifres cortadas para, em seguida, receberem uma proteção em couro, prática considerada inaceitável na Espanha. Mesmo assim, alguns cavalos Lusitanos morrem na arena, seja em decorrência de chifradas, seja devido a ataques cardíacos desencadeados pelo grande esforço a que são submetidos, principalmente em dias de muito calor.
Entre as singularidades da Espanha, merecem destaque sua diversidade linguística (com falantes dos idiomas espanhol, catalão, galego e basco), sua liderança mundial na produção de azeite de oliva e o hábito da “siesta”, com o fechamento do comércio no início da tarde para o cochilo geral da população durante algumas horas. Outra curiosidade é que o Hino Nacional espanhol (inicialmente chamado de “Marcha Granadera” e depois, de “Marcha Real”), datado do século XVIII, é um dos únicos do mundo constituído apenas pela melodia, porque não tem letra oficial. E na Espanha, foi escrito o segundo livro mais traduzido e vendido no mundo (atrás apenas da Bíblia): “El Ingenioso Hidalgo Don Quijote de La Mancha”, de autoria de Miguel de Cervantes Saavedra, escritor com tamanha influência sobre o idioma que o espanhol é muitas vezes chamado “La lengua de Cervantes”.
Vale lembrar que, nos anos 1990, em muitos países europeus, foi deflagrada uma campanha irracional impondo duras restrições legais à criação e posse de alguns cães de guarda considerados perigosos, e que, na verdade, conclamava ao holocausto de várias raças. Naquele triste cenário de ameaça da extinção do Fila na Europa, os cinófilos passaram a ter permissão para possuir apenas um cão, que era obrigado a ficar confinado no canil e ainda tinha de se submeter às inspeções periódicas, e de surpresa, à sua casa, feitas por um fiscal, para constatar que o animal permanecia devidamente engaiolado. No entanto, recentemente, a Espanha aprovou uma nova e polêmica legislação, considerada das mais avançadas do mundo em proteção e bem estar dos animais domésticos e das espécies silvestres mantidas em cativeiro. O documento, com 53 páginas, publicado em março de 2023 pelo “Boletín Oficial del Estado”, estabelece as obrigações dos proprietários e as punições aos infratores, que podem chegar a multas de até 30.000 euros e prisão de até três anos.
Cães e gatos não podem mais ser vendidos em pet shops, a apresentação de animais em circos itinerantes está proibida, assim como sua utilização em testes para fins cosméticos e científicos. Todas as pessoas que desejarem possuir um cão devem fazer um curso de capacitação e serem aprovadas em um teste. Os proprietários de cães de qualquer raça precisam assumir uma apólice de seguro de responsabilidade civil. Os filhotes têm de ser esterilizados antes de serem entregues ao comprador. Apenas as pessoas que se dediquem à criação intensiva podem obter a licença fiscal para possuir animais férteis. Elas precisam, obrigatoriamente, ter uma autorização oficial para constituir um Núcleo Zoológico, que jamais é permitido em zonas urbanas. São isentos dessas exigências os cães utilizados para o trabalho com gado, os pertencentes aos corpos e forças de segurança do Estado e os usados pelos caçadores. Não deixa de ser irônico que a legislação criada para proteger os animais permita sua utilização para caçar e matar os pertencentes a outras espécies. Atualmente, diversas associações cinófilas estão empenhadas em incorporar à lei a categoria do criador chamado de amador, ou familiar.
Em muitas cidades espanholas é digno de nota o grande número de pessoas passeando com seus cães, tanto durante o dia, como à noite. E lá, diferentemente do Brasil, não existem cães sem donos, vagando sozinhos, nem se encontram fezes dos animais pelas ruas ou pelas calçadas, pois os condutores levam sacos plásticos para recolher os excrementos, mesmo os feitos na grama. A imensa população canina na Espanha é bem maior que a de crianças e adolescentes, tendo crescido ainda mais durante a pandemia. Um censo recente aponta a existência de cerca de 15 milhões de pets registrados e de 6,6 milhões de pessoas com menos de 15 anos.
Os cachorros constituem companhia constante em todos os lugares, inclusive dentro de restaurantes e nos pontos turísticos, como no Parque Nacional dos Picos da Europa, o primeiro do gênero criado no país, em 1918, declarado Reserva da Biosfera pela UNESCO e onde ainda vivem o urso pardo e o lobo ibérico. E muitos dos mascotes caninos, sempre muito bem tratados e bem vestidos (nesta época de outono, as temperaturas por lá já são baixas e eles usam abrigos para protegê-los do frio), pertencem à categoria antigamente por aqui chamada de “vira-latas”. Quando as velhas e anti-higiênicas latas de lixo passaram a ser substituídas por sacos plásticos, a denominação desses cães não mudou para “rasga-sacos” e eles continuaram a ser conhecidos como “vira-latas”. Hoje, nestes tempos hipocritamente corretos, os cães de rua são chamados de “sem raça definida” (SRD) e os mendigos, de “moradores de rua”. Causou-me forte impressão, na Espanha, ver uma mulher andrajosa, num beco, acompanhada por um cachorrinho mestiço que trajava uma roupinha em muito melhores condições do que os trapos que mal cobriam sua dona. Ou seja, o “vira-lata” estava muito mais bem vestido que a mendiga. Na cidade de Bilbao, chama a atenção uma enorme peça de topiaria (a arte de recortar árvores e arbustos em diferentes formatos) com 12 metros de altura, 60 toneladas de peso e totalmente coberta por diversas espécies florais das mais variadas cores, na forma de um imenso Terrier. Ela é constituída por uma estrutura de aço inoxidável sobre uma base de concreto e dotada de sistema interno de irrigação. Este cão, chamado “Puppy” (Filhote) é considerado o guardião do Museu Guggenheim, em frente ao qual está posicionado.
E fora da zona urbana, nos sítios e fazendas, os numerosos rebanhos de ovelhas e cabras ainda são protegidos pelos tradicionais Mastim Espanhol e Mastim dos Pirineus, raças de grandes molossóides de origem muito antiga. Nessa atividade, a proporção é de um cão para 150 a 200 cabeças. Por lá, nas regiões afastadas dos centros urbanos, ainda existem lobos que atacam o gado e causam grandes prejuízos aos fazendeiros. Esses guardiões de rebanhos usam uma coleira de metal, ou de couro, chamada “carlanca”, guarnecida de fortes hastes pontiagudas, o que justifica o registro de algumas curiosidades.
Na época da chamada Santa (embora, na verdade, fosse diabólica) Inquisição, San Blas de Sebaste (264 – 316) – no Brasil, chamado de São Brás ––, depois de martirizado e decapitado, passou a ser considerado o protetor das doenças da garganta, tanto das pessoas como dos animais. Os molossos utilizados para proteger os rebanhos dos ataques de predadores traziam, no pescoço, a “carlanca”, aparato que remonta aos tempos da Grécia Antiga e é chamado de “wolf collar” na Inglaterra e de “roccale” ou “vreccale” na Itália. No passado, essas coleiras eram fabricadas artesanalmente sempre em datas de festas religiosas de grande importância, consideradas propícias para a produção de amuletos de sorte, especialmente no dia de Corpus Christi, no de Ascenção e na segunda-feira de Páscoa. Com o objetivo de reforçar a proteção ao pescoço dos cães contra as mordidas dos grandes predadores, elas também costumavam ser banhadas em água benta e recebiam correias que houvessem estado em contato com alguma imagem ou relíquia de San Blas. Esse bispo, médico e mártir, por ser cristão, tinha sido vítima das perseguições iniciadas na Armênia pelo imperador Diocleciano. Refugiou-se em uma caverna onde, dizem, costumava tratar dos animais selvagens que, feridos ou doentes, ali o procuravam. Depois de sua morte, diversos milagres passaram a ser atribuídos a ele. Tornou-se tão popular que, na Itália, 35 igrejas foram erigidas em sua homenagem. Também me ocorre que a Igreja Católica considera Santa Luzia de Siracusa (280 – 304) a protetora dos olhos e da visão. Contemporânea de São Brás, ela também foi perseguida, presa e torturada pelos inquisidores, tendo seus olhos arrancados pelo carrasco antes de ser morta. E, finalizando, não se pode deixar de considerar que, devido à sempre surpreendente maldade humana, o patíbulo foi o palco em que a santa protetora dos olhos teve os seus arrancados e o santo protetor da garganta teve a sua cortada.
No rol de semelhanças entre Brasil e Espanha, salientam-se a forte influência cultural do catolicismo, a paixão pelo futebol, o caráter mais extrovertido das pessoas e a similaridade dos idiomas, embora existam muitos falsos cognatos que levam o falante do “portunhol” a confusões e, até, a situações ridículas.
O nosso “rato”, em espanhol é “ratón” e o “rato” deles, em português é “momento”.
A nossa “escova”, em espanhol é “cepillo” e a “escoba” deles, em português é “vassoura”.
O nosso “esquisito”, em espanhol é “extraño” e o “exquisito” deles, em português é “saboroso”.
O nosso “fraco”, em espanhol é “débil” e o “flaco” deles, em português é “magro”.
Voltando à 18ª Exposição do Fila Brasileiro CAFIB na Espanha, ela foi organizada por Octavio Rodríguez Alonso e Tsvetelin Paskov, tendo atuado como cobaia nas provas de temperamento o competente Daniel Cerdan. As gravações em vídeo e as fotografias ficaram a cargo de Jana Stankova e Inês Van Damme. E os trabalhos de secretaria foram desempenhados por Jaime Pérez Marhuenda. O local do evento foi Elche, uma cidade pertencente à província de Alicante, na Comunidade Valenciana, e habitada por pessoas de alta renda, principalmente devido ao sucesso dos empresários do setor de calçados, tanto que é a segunda do mundo em número de automóveis da luxuosa marca Mercedes-Benz. Uma de suas mais conhecidas atrações é o famoso e antiquíssimo palmeiral, plantado no tempo dos fenícios e diversas vezes modificado na época medieval por cristãos e muçulmanos. Tombado como Patrimônio Mundial da Humanidade pela UNESCO, essa típica paisagem africana e islâmica na Península Ibérica, abriga dezenas de milhares de palmeiras, pertencentes a numerosas espécies, algumas das quais chegam a ultrapassar os 30 metros de altura e outras vivem mais de 300 anos. Em Elche, a lei proíbe a derrubada de palmeiras e se alguém comprar um terreno para edificar qualquer tipo de construção precisa se amoldar a distribuição dessas espécies, ou obter autorização legal para transplantá-las. Lá todas as palmeiras estão recenseadas e seus proprietários recebem subvenções para conservá-las adequadamente.
Palmeiral de Elche
E a UNESCO também outorgou a esse município o título de Patrimônio Imaterial da Humanidade pela festa “O Mistério de Elche”, única representação teatral realizada dentro de uma igreja católica. Essa cerimônia teve início no século XII e consta de dois atos, cada qual celebrado num dia, na Basílica de Santa Maria, edificada no mesmo local onde havia uma mesquita árabe, destruída após a reconquista da cidade em 1265. A peça retrata os últimos momentos de vida da Virgem Maria, com a chegada dos apóstolos para sua despedida e, em seguida, a subida da Santa ao céu. Esse templo atual foi erigido entre os séculos XVII e XVIII e, embora tenha o título de Basílica Menor, os moradores da região o chamam de Catedral de Elche.
O evento do CAFIB foi uma iniciativa do criador espanhol de Filas Jaime Pérez Marhuenda, a quem deve ser creditado o trabalho mais importante na divulgação da raça brasileira na Europa por meio de artigos e notícias na imprensa especializada. Desde muito jovem apaixonado por cães e estudioso de cinofilia, especialmente das raças de grandes molossos de guarda, Jaime Pérez conheceu o Fila Brasileiro no início dos anos 1980 e, dez anos depois, adquiriu seu primeiro exemplar, proveniente de Minas Gerais. Nos anos 1990 passou a integrar a diretoria do CEMA (Club Español de los Molosos de Arena), entidade que atuava em prol do melhoramento genético dos grandes molossóides. Em 1994 filiou-se ao CAFIB, passou a vir diversas vezes ao Brasil e tornou-se nosso representante na Espanha. A partir de 2005, ele começou a promover Análises de Fenótipo e Temperamento seguidas de Exposições de acordo com os regulamentos do CAFIB-Brasil, cujos juízes passaram a ser convidados para conduzir esses eventos. Em 2006, ele foi um dos fundadores do CAFIBE – Club de Amigos del Fila Brasileiro en España, na cidade de Alicante. Essa entidade, sem fins lucrativos, foi criada com o objetivo de defender os mesmos valores, princípios e missão que sempre nortearam seu inspirador brasileiro, o CAFIB; e surgiu em decorrência da confusa indefinição de características de que o Fila foi vítima, devido às repentinas alterações em seu padrão por parte da FCI, que passou a considerar faltas desqualificantes (para todas as raças) qualquer manifestação de agressividade a estranhos nas pistas de julgamento. Essa grave punição às reações de temperamento típicas e originais do Fila Brasileiro, na opinião de Jaime, acabou por descaracterizá-lo completamente. Considerando impossível o correto exercício da avaliação oficial de cães de guarda e, com objetivo de dedicar-se basicamente ao melhoramento genético do Fila, ele renunciou a suas credenciais de juiz internacional da entidade máter da cinofilia mundial, assim como da tradicional Real Sociedad Canina de España. Esta última associação tinha sido fundada em 1911, como Real Sociedad Central de Fomento de las Razas Caninas en España e, em 1912, obteve o reconhecimento oficial pela FCI (que também fora constituída no ano anterior, na Bélgica). Jaime continuou, entretanto, a ocupar o cargo de tesoureiro da Sociedad Canina de Alicante e a desempenhar a função de Comisário General de las Exposiciones Nacionales e Internacionales de Alicante. Com o tempo, ele foi se tornando uma espécie de embaixador do Fila Brasileiro e seu Canil Acaboclado enviou exemplares para os Estados Unidos, México, República Dominicana, Venezuela, Portugal, Itália, Holanda, Alemanha, Polônia, República Tcheca, além de diversas regiões da própria Espanha. Daqueles primeiros tempos, Jaime se recorda com carinho da palestra que proferiu sobre o Fila Brasileiro na República Tcheca, a convite de Jan Kubesa, para juízes e criadores daquele país, seguida pelo julgamento de uma exposição especializada. Ele atuou como juiz nas principais exposições da FCI na Europa e no continente americano, assim como nas especializadas de molossos do CEMA, entidade em que, por mais de uma década, ocupou os cargos de vice-presidente, de responsável pelo Fila Brasileiro e de redator da revista então regularmente publicada. No Club Español de los Molosos de Arena, Jaime foi incumbido de defender o reconhecimento, pela RSCE (Real Sociedad Canina de España), dos pedigrees emitidos pelo CAFIB. Depois de uma exaustiva reunião, realizada em Alicante, foi, finalmente, plantada a semente que resultou na reabertura do Registro Inicial e na permissão para inscrição dos chamados “Filas CAFIB” no Libro de Orígenes Español. Além do Fila Brasileiro, Jaime também recebeu o credenciamento pela FCI para julgar outras 11 raças molossóides: as espanholas Dogo Canário, Mastim Espanhol, Mastim dos Pirineus e Cão de Presa Maiorquino (ou Ca de Bou, em catalão), as britânicas Mastiff e Bullmastiff, a francesa Dogue de Bordeaux, a italiana Mastino Napoletano, a japonesa Tosa Inu e as soviéticas Owtcharka da Ásia Central e Owtcharka do Cáucaso.
Américo e Jaime Pérez
Ao rememorar os fatos e eventos marcantes da história do Fila Brasileiro ao redor do globo, e as pessoas das mais diversas nacionalidades que vêm participando das atividades de melhoramento genético da raça, não se pode deixar de render homenagem à atuação impressionante de Inês Van Damme. Essa culta senhora holandesa, poliglota e profunda conhecedora de música clássica – que há muitos anos mora na Espanha, onde, com seu falecido marido Pedro Van Damme, fundou o canil Los Tres Naranjos –, tem feito numerosas viagens pelo mundo para recolher informações, levantar dados, fotografar, ouvir histórias e conversar com criadores sobre o Fila Brasileiro, garimpando assim a matéria-prima necessária para escrever seus livros. Inês, notável historiadora da raça, veio muitas vezes ao Brasil e, com certeza, seu conhecimento prático sobre o nosso país é bem maior que o de grande parte dos brasileiros. Entre as numerosas fotografias, atuais ou garimpadas em velhos arquivos, que ilustram suas obras, estão registradas imagens de criadores pioneiros, como José Gomes, Pedrinho do Engenho, João Costa, diversos integrantes da família Reis, William Chalmers e Paulo Santos Cruz, além das antigas propriedades rurais mineiras, como a histórica Fazenda Jaguara, com seus pitorescos canis de madeira, os cães deitados ao lado de fogões de lenha ou sendo alimentados com o tradicional angu de milho misturado com leite e também fotos mostrando o preparo dessa ração em panelas de ferro sobre uma fogueira acesa no terreiro. Ao lado dessas, figuram belíssimas imagens de grandes boiadas e de Filas trabalhando com gado zebu nas remotas paisagens do Pará, nadando em açudes no meio dos pastos, deitados à sombra de uma mula amarrada na cerca, caminhando pelos currais e viajando por estradas de terra em carrocerias de caminhonetes. E as fotografias também mostram retratos pitorescos do nosso país, com cenas curiosas, principalmente para os moradores do Hemisfério Norte, como a captura de morcegos hematófagos que sugam o sangue de bovinos, equinos e muares nas fazendas, além de uma pose da autora ao pé de uma árvore colossal em plena Floresta Amazônica, comendo cupuaçu, uma fruta suculenta que só existe no Brasil e que, por ter sido sempre muito apreciada pelos índios, conserva seu nome original, em idioma guarani. E é digno de admiração que essa senhora – com objetivo de conhecer e entender melhor a história, antiga e atual, do Fila, bem como as condições práticas em que a raça vem sendo criada nas cidades e fazendas brasileiras –, tenha, sozinha, percorrido estradas muitas vezes precárias, ora empoeiradas, ora lamacentas, sacolejando bravamente em velhas Kombis e lotações, ou em arcaicos ônibus e jardineiras, pelos mais recônditos rincões deste país tropical. Em 1993, ela publicou, em holandês, a obra intitulada “Fila Brasileiro”. Sete anos depois, editou, em espanhol, “El Gran Libro Del Fila Brasileño” e, em 2005, lançou “Filas y Fazendas”, que também conta com edições traduzidas para os idiomas inglês e italiano. E, como se não bastasse, em um trabalho conjunto com o já citado criador espanhol de Fila Brasileiro, Jaime Pérez Marhuenda, Inês fundou o Cafibe – Club de Amigos Del Fila Brasileiro en España, além de ter sido sua primeira presidente. Nesta 18ª Exposição do CAFIB na Espanha, eu tive a honra de entregar a ela uma medalha comemorativa dos 45 anos da fundação de nossa entidade.
Inês Van Dame, Américo e Cleide
A 18ª Exposição do Fila Brasileiro CAFIB na Espanha, em Elche, foi realizada no Centro Canino Ngorong-Ngorong, uma instituição que conta com hotel para pets e escola de adestramento, além de se dedicar à criação de diversas raças de cães. Os 15 Filas inscritos para o julgamento já tinham sido previamente analisados e aprovados por Jaime Pérez e este número pequeno de exemplares em pista me permitiu fazer comentários sobre a avaliação e a classificação de cada um. O resultado completo está publicado no site do CAFIB e os principais títulos foram:
MELHOR MACHO: Duque Barão dos Filas, de Octavio Rodriguez Alonso (Aranda del Duero, na Província de Burgos)
MELHOR FÊMEA: Duna Barão dos Filas, de Marcos Pérez (Mutxamel, na Província de Alicante)
MELHOR CABEÇA: Duque Barão dos Filas, de Octavio Rodriguez Alonso (Aranda del Duero, na Província de Burgos)
MELHOR TEMPERAMENTO: Tasia de Sotondo, de Octavio Rodriguez Alonso (Aranda del Duero, na Província de Burgos)
E, para finalizar, Cleide e eu registramos nosso profundo agradecimento a Jaime, Elvira e filhos, que nos hospedaram regiamente em sua residência